COLUNA DO CARLOS JOSIAS : Diretor Jurídico do Grêmio 93/98, Conselheiro 94/2010 e Vice-Presidente 2005/07. Josias @cajosias é colunista do Grêmio Blog dos Imortais. www.facebook.com/cjosias.oliveira
O PRÍNCIPE CHILIQUENTO
Nasci temporão, meu pai, descendente de portugueses, ex atleta do vovô,
SC Rio Grande - padrinho do Grêmio na fundação - fanático por futebol, desde
cedo me levou a simpatizar pelo jogo - tinha 51 anos quando nasci. Minha mãe,
direto de ancestrais de Andaluzia, contava com 43 anos, numa época em que ter
filhos, nesta idade, não era anormal, e o parto era exatamente o natural -
cesárea, nem pensar. A humanidade às vezes parece que involui. Cresci entre
adultos misturando o português nacional-luso com o espanhol falado caseiramente
em boa parte da minha infância. Era uma loucura, amava-se os beatles, os Stones
entre boleros, recuerdos de ypacarai, e ya no estas mas a mi lado, corazón, en
el alma solo tengo soledad, y si ya no puedo verte, porque dios me hizo
quererte, para hacerme sufrir mas ? Uma verdadeira miscelânea cultural que
atravessou uma década até chegar a revolução, ou como queiram, o golpe: foi
quando me transferi para Porto Alegre onde na adolescência me deparo com de
tudo um pouco, de Led Zeppellin ao contemporâneo Nei Lisboa dos bares do Bom
Fim:
Nasci de uma família pobre
E rodei pelo mundo procurando alguém
Que me dissesse o que fazer
E me desse uma chance de vencer
Estudei, entrei até, pela porta da frente, entrar na Universidade.
Venci.
Antes disto ... e na verdade, quando vim meu coração já estava aqui. O
Grêmio havia emprestado um jogadorzaço para o vovô ele, menino, treinado pelo
irmão, Kim, foi, pelo Rio Grande, goleador do campeonato gaúcho. Tinha um
apelido: Bugre. Terminado o ´certame`, o Grêmio repatriou o matador que se
transformou no maior centroavante que vi jogar: Alcindo. Quando ele deixou a cidade
do porto e veio para a capital e com ele veio meu coração que
aportou no tricolor. Nunca mais deixei esta que é a única religião que povoa as
minhas preces: o Gremismo.
Rio Grande, pelo porto, era uma espécie de cidade multinacional, mas se
gritassem Manoel ou Joaquim se enchia qualquer esquina. Apesar de recheada por
judeus, libaneses, cristãos e católicos de todos os gêneros, com seus colégios
de padres e freiras, a cidade, era de domínio luso. Os portugueses adoram
piadas e se divertiam - ante a falta de outro entretenimento - contando-as um
dos outros e dos seus e, talvez dai, tenha se originado as nossas boas e
sacadas anedotas deles, vale dizer, nossas sátiras, hoje, dos patrícios, nada
mais são do que uma repetição do que eles mesmos contavam: eu ouvia histórias
atentamente, e eram muitas.
As piadas nada mais são do que uma curta história do cotidiano, de final
cômico, e as mais corriqueiras repousavam exatamente sobre a grande arte da
cidade: o futebol, afinal ela, cidade, foi o berço dele, futebol, na nossa
pátria amada. Depois o esporte se esparramou, como a batatinha, pelo país
inteiro, só que aquela não se ´esparrama`, mas espalha rama .. pelo chão. O
jogo se esparramou.
As anedotas eram quase infantis, não havia maldade, não havia malícia, e
quanto mais ingênua, mais riso provocava ... até o advento da pornografia.
O goleiro, hoje, é intocável na pequena área. Nos primórdios, valia
tudo. Goleiro não ficava mais do que um pentelhonésimo de segundo com ela na
mão porque ao atacante era permitido meter-lhe os pés no peito ou por onde
pegasse e atirá-lo com bola e tudo para dentro: era gol, valia. Fato !
Entre tantas, meu pai contava que certa vez a seleção de Portugal
disputava uma partida importantíssima e decisiva e ao apagar das luzes com o
título quase na mão o juiz assinalou uma falta máxima, o desgraçado do pênalti.
Mas havia uma garantia: no gol, Manoel era um gigante, defendia tudo. Armou-se
a cobrança e a inchada apreensiva roía as unhas mas confiava, Manoel há de
defender esta. No centro do gol Manoel se postava gigante diante do cobrador
nervoso. Manoel usava um boné, e quando o atacante de ´linha` correu para a
bola o ´golgoalkeeper` pediu um instante .... para perturbar o batedor. Tirou o
boné e o atirou para dentro do gol. Voltou para a posição de defesa e encarou
seu carrasco. Perturbado, o atirador meteu a bola nas mãos do ´guarda-redes`. A
massa foi ao delírio. Uma verdadeira histeria coletiva, provavelmente a
primeira grande ode da história futebolística a um herói. Manoel se ergueu,
suspirou, sorriu...se virou e foi no fundo da goleira apanhar seu boné. O Juiz,
claro, marcou bola ao centro: gol !
O tempo passou e apareceu a obra de Antoine de Saint - Exupéry. Seu
Joaquim da ´venda` ficou impressionado com o livro, chamou Maria e lhe disse,
traz o Manoelzinho aqui que isto é para ele ler, o Professor e Bardo Rochetaux
recomendou, é cultura. Almeida, da Padaria que descansava sorvendo uma
aguardente passou os olhos por sobre os escritos e vaticinou: afrescalharam o
futebol !
Conta a lenda que foi o primeiro pontapé para a criação do chilique no
jogo... misturaram tudo.
Uma profecia. Nascia ali a referência sobre o Príncipe Chiliquento. Era
o jogador que se melindrava por qualquer coisa ... o irritadinho... um Dale,
daqueles tempos. Hoje vejo que isto não era piada. Impressionante o que tem de
chiliquento no futebol.
E o que é pior: dirigente chiliquento ! E temos alguns em plena
atividade tantos anos depois ...ai é demóóóóóóís !
Obs, a foto é do SR Rio Grande no final da década de 20 - meu pai, é o
primeiro da direita para a esquerda, de boina; apelido = Pato; motivo (
verdadeiro ) = o Rio Grande tinha um grande goleiro, de apelido Pato; num jogo
sem mais poder fazer substituição ele se lesionou ... meu pai, zagueiro,
Carlos, foi para o gol ... na hora do pênalti ... defendeu ... não jogou a
boina para dentro das redes, segurou a bola e dela se livrou chutando rápido
para frente ... RG venceu ... virou o herói da partida e cunhou a alcunha =
virou Pato ...e não precisou ser metido a ganso, era Pato Bom e não Pato Novo !
abs
Dale das Antigas kkkkk e tem dirigente no principado é ?
ResponderExcluirMauricio
Concordo e discordo. Discordo da "involução" citada no 1º parágrafo; muitas mulheres morriam de parto naquela época. Concordo com o centro-avante; Alcindo era fantástico.
ResponderExcluirAos mais jovens, reparem na fita preta na lapela no casaco do senhor de chapéu bem a direita da foto. Se chamava "fumo" e sinalizava que havia morrido alguém próximo dele. Os parentes em primeiro grau (esposa, filhos)se vestiam totalmente de preto, pelo menos nos primeiros 6 meses. Os mais afastados, usavam o fumo. Após 6 meses, podiam adotar "meio-luto", mesclando preto com branco. Vermelho, nem pensar; era desrespeitoso e agressivo. Continua sendo.
Paulo Ferrer: 1 ) Genial a do fumo, não sabia mesmo 2 ) No caso dos partos na verdade eu me referia mais para trás, mais para os primórdios ...aos nativos, as índias tinham filhos de cócoras, em meio ao mato, e ao que tudo indica, e pelo que se sabe, o índice de mortalidade delas era insignificante. O Homem branco trouxe as enfermidades .... e, realmente, na década em que nasci pelo que li havia sim muita mortalidade nos partos. Bem, faltou dizer ali em cima, entrtanto, que eu nasci em casa, de parto natural, via ´parteira` e hoje to aqui firme e forte ! Abs amigo
Excluir...complementando ... eu sabia da tarja, isto sim, quando alguém se trajava com ela era sinal de luto - e isto era muito comum -pelo que me lembro alguns cortavam um pedaço da gravata tb - mas com esta riqueza de detalhes nem pensar
Excluirabs
Carlos Josias relembra a sua Rio Grande , onde nasceu um dos políticos mais corretos que esse Estado conheceu: Carlos Santos. Carlos Santos, avô do músico Carlinhos Santos( amigo do Josias), foi deputado estadual, federal e presidente da Assembléia Legislativa do RS. Também assumiu interinamente o governo do RS. Honrou como poucos o parlamento gaúcho.
ResponderExcluirArtur Ferreira
Pois o Carlos Santos qdo assumiu estava no Palacinho do Vice e foi chamado certa madrugada pelo Delegado de Polícia da região diante de um casa sério com conotação política que houve na ocasião. Carlos Santos, negro, estava dormindo no referido Palacinho que ficava quase em frente a delegacia. Figura modesta e bonacha, C Santos atravessou a rua de pijama e entrou na DP. O atendente encaminhou ele ao Delegado que não o conhecia pessoalmente. Ele sentou à frente da mesa do delegado, que não estava na sala, e tomou um chá de cadeira. Após um tempo apareceu o delegado viu C Santos sentado ( que estava, não se esqueçam, Governador ... ) e indagou com voz enérgica: E ai Negrão, fala o que te aconteceu rápido....
ExcluirInteressante a história do Paulo Ferrer sobre o fumo.
ResponderExcluirArtur Ferreira
É Artur, antiamente o cara quando levava fumo era bem diferente de hoje
ResponderExcluirRogério Rosa
Muito boa Josias, divertida e elucidativa ...
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